quarta-feira, 19 de dezembro de 2007


Essa é a imagem da classe média que lê nossos jornalões e assistem nossas TVs.

(foto de Renê Maltête)

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

QUANDO TODO MUNDO FALA E NINGUÉM TEM RAZÃO

3.12.2007

O ex-presidente Cardoso, em momento de boquirrotismo explícito, acabou falando mais uma bobagem: ironizou a situação de Lula, por não ter estudos. O atual presidente, também ele um boquirroto de carteirinha, acusou o golpe e respondeu duro (outra bobagem, porque elogio em boca própria é vitupério, já diz o ditado): não tem tantos anos de estudo como seu antecessor, mas governa melhor.

Vou meter a minha colher de pau nessa polêmica, porque, primeiro, gosto de uma boa briga; segundo, porque, quando se fala demais, dá-se bom dia a cavalo, como dizia minha mãe.

Fatos: Fernando Henrique Cardoso é schollar, sociólogo com obras publicadas, respeitado por sua erudição e saber. Lula, o metalúrgico, tem apenas um curso no Senai. Trajetórias de vida absolutamente diferentes: classe média de um lado, com todas as suas aspirações burguesas; retirante nordestino, de outro, com todas as suas implicações e anseios que isso pode trazer.

Têm, em comum, apenas o fato de que chegaram ambos à Presidência da República.

FHC nunca enfrentou preconceitos, por falar bem, escrever razoavelmente, ter viajado por todo o mundo, ter sido aluno e professor de uma das nossas mais prestigiosas faculdades. Tem, portanto, aquilo que se costuma chamar de cultura.

Lula não tem a erudição de FHC. Não estudou. Mas tem conhecimento, tanto quanto uma vasta experiência de vida, de observações práticas, nascido, criado e formado que foi num outro cadinho de cultura, que a erudição costuma chamar de popular. Mas, chame-se do que se chamar, também é cultura.

Porque é aí que começa a confusão. Confunde-se cultura com erudição. Inteligência com conhecimento. E fala-se muita besteira.

Louve-se a erudição de Fernando Henrique Cardoso. Mas, ressalve-se que tal erudição não lhe confere nem mais nem menos conhecimento e cultura do que o conhecimento e a cultura de Luís Inácio Lula da Silva. Porque, a despeito de toda a diferença entre eles, são ambos homens inteligentes e absolutamente aptos para a mesma tarefa a que se propuseram: governar este País (se há um melhor que outro nesse mister, é questão de opinião, de ponto de vista, de engajamento nessa ou naquela corrente política, o que, absolutamente, não vem ao caso, no momento).

O preconceito que parece vir expresso nas palavras do ex-presidente é fruto, apenas, daquele tipo de discurso para inglês ver (no caso, para deleite de um bando de tucanos, em convenção), que provoca o riso de quem ouve, por pretender desqualificar o adversário pela ironia, por aquilo que o vulgo chama de gozação. E ironia, todo mundo sabe, é o argumento de quem não tem argumentos ou não deseja argumentar, somente jogar para a platéia, como parece ter sido o caso (tanto, que ele, depois, disse que não queria dizer exatamente o que disse, ou seja, desconversou). Mas, o estrago já estava feito. O preconceito que, tenho certeza, não existe no pensamento mais profundo de FHC, já se instalara na mente do povão. E de certos comentaristas, claro.

E o preconceito cristalizou-se no nível da linguagem: Lula não sabe falar bem o português e não fala outros idiomas. FHC fala razoavelmente bem o português e o inglês e o espanhol...

Bem, este é o ponto exato de onde provém a dor (como dizia um amigo meu, uma das pessoas mais inteligentes e cultas que eu conheço, mas que nunca passou do primário, em termos de escolaridade): a linguagem.

Há muito que a Filologia, a Lingüística e as Ciências da Comunicação já desmistificaram o conceito de erro em linguagem. Ou seja, não há, propriamente, erro: há falares diferentes, dialetos e idioletos, regionalismos, gírias e jargões. Explique-se: quando aprendemos a falar, aprendemos a linguagem, que é a capacidade humana de se comunicar através de sons articulados, não necessariamente ou obrigatoriamente a língua e sua gramática, que é a especialização erudita da linguagem de um grupo social. E língua pressupõe um código rígido de regras e normas, uma gramática. Não que a linguagem também não tenha um sistema, mas esse é mais flexível, mais intuitivo. Porém, nem mais nem menos errado.

Um exemplo simples (sem entrar em conceitos e nomenclaturas complexas): no sistema de linguagem que a criança (de fala portuguesa, evidentemente) aprende, está a conjugação de verbos do tipo correr: corro, corri etc. Assim, quando precisar usar o verbo caber, irá a criança dizer, por analogia: cabo, cabi. Está errado? Não, exatamente. Está dentro do sistema. Mas, esse verbo tem outra origem e trajetória dentro da língua chamada impropriamente de culta e, por isso, tem outra formatação fonética e fonológica. Assim, vem a gramática (que é conservadora, no sentido de estar atenta aos detalhes de origem e desenvolvimento da língua) e decreta: não é eu cabo nem eu cabi, mas eu caibo e eu coube.

Tem a gramática a função (repito) de conservar a língua, de mantê-la dentro de parâmetros que a tornem menos dinâmica, ou seja, de evitar que a língua (e a linguagem) se modifique tão rapidamente, que uma geração não consiga entender perfeitamente as anteriores.

Além disso, à gramática cabe o papel de policiar o código escrito, um meio de comunicação muito mais sofisticado e complexo, orientado muito mais para o futuro e para outros falantes de erudição do que para o presente, sem nenhuma preocupação com falantes que não dominem esse código, o que exacerba o seu conservadorismo.

É claro que saber falar e escrever bem um idioma pode, e deve, ser motivo de orgulho, porque pressupõe estudo, erudição e dedicação, muita dedicação. Mas tem-se que pensar que é isto, apenas, e nada mais: o domínio de uma ferramenta. Como um marceneiro sabe usar serras, talhadeiras, chaves de fenda etc. E, assim como dominar as ferramentas não torna o marceneiro um artista, ou mesmo um artesão, também dominar a língua e sua gramática não torna ninguém nem mais culto nem mais sábio.

Portanto, nessa pinimba entre o atual e o ex-presidente, todo mundo fala e ninguém tem razão. Porque, na verdade, mesmo, o que vale é o que cada um pensa, sua weltanschauung, suas motivações, interesses e ideário social, econômico e político. Discutir escolaridade de um e de outro, pôr reparo na fala mais ou menos canhestra de Lula em comparação com a fala empolada de FHC, a essa altura do campeonato, é bobagem. Puro sexo dos anjos.

Isaias Edson Sidney

Um pós-escrito (mais ou menos longo): Lula não tem escolaridade, porque não teve, quando jovem, oportunidade de estudar. E desenvolveu, depois, por opção, por circunstâncias da vida, outra trajetória, outra forma de contato com a realidade, de busca de conhecimento da identidade do povo e de seus problemas. Por isso, chegou à Presidência. E isso é um fato, não tem nada a ver com gostar ou não gostar dele, com apoiá-lo ou não. Lula não é nem pode ser exemplo para ninguém deixar de estudar. Se algum jovem disser que não precisa estudar, porque ele, Lula, não estudou, responda: então, nasça no Nordeste, venha num pau-de-arara para São Paulo, sobreviva nas piores condições de vida possíveis, torne-se metalúrgico e líder dos metalúrgico e presidente de sindicato e lute contra a ditadura e funde um partido etc. etc.

domingo, 25 de novembro de 2007

Abaixo-assinado pede punição à Globo

- por Renato Rovai, editor da revistá Fórum ( http://www.revistaforum.com.br/sitefinal/blog/)

A divulgação que iniciamos a partir deste blog daquele vídeo da entrevista de Jô Soares com um taxista que trabalhou em Angola. Lembram? Aquele mesmo onde esse taxista abordava "a vida sexual angolana" e falou entre outras coisas que o "negro começa seu relacionamento sexual com garotas de 6, 7 anos e gosta de sentir as mulheres apertadas". Pois então, aquela nossa divulgação já está tendo dois resultados objetivos para além da indignação. Acabo de receber um abaixo-assinado que está circulando na internet e será encaminhado para os ministros Tarso Genro, Nilcéia Freire e Matilde Ribeiro, como também para o Procurador Geral do Ministério Público do Rio de Janeiro.

O abaixo-assinado solicita um pedido de desculpas da Rede Globo por ter transmitido aquele vídeo. Evidente que já o assinei. Sugiro que todos os leitores que como eu se indignaram com aquela estupidez façam o mesmo e divulguem o texto e o vídeo para sua lista de amigos. Quem não tiver assistido ao vídeo pode assisti-lo neste link . Afora isso, também fui informado que a campanha "Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania" já encaminhou denúncia para o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro e que a Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão do Rio de Janeiro, Márcia Morgado, instaurou processo judicial contra a Rede Globo de Televisão, a fim de identificar se realmente houve desrespeito às comunidades negras.

Para acompanhar os desdobramentos do processo, os interessados podem acessar o site do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro com o seguinte número MPF/PR/RJ/nº 130012000689200758, ou pelo site www.eticanatv.org.br.

Leia o abaixo assinado abaixo e se quiser assiná-lo entre
neste endereço.

Até o final da semana, a petição também estará online em inglês e francês. Os organizadores estão procurando um voluntário para traduzi-lo para o espanhol. Quem tiver sugestões e quiser colaborar diretamente na mobilização, pode entrar em contato diretamente com: Élida Lauris ( elida.santos@uol.com.br), Lourenço Cardoso ( lourencocardoso@uol.com.br) ou Rose Barboza (rose.bs@uol.com.br).



Íntegra do texto do abaixo-assinado: Ilmo Sr, Ministro da Justiça, Tarso Genro

Ilma Sra, Secretária Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro

Ilma Sra, Secretária Especial de Políticas para Mulheres, Nilcéia Freire

Ilmo Sr, Procurador-Geral do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro

Nós, os abaixo-assinados, repudiamos o conteúdo exibido na programação da Rede Globo de Televisão, no dia 18 de Junho de 2007, durante o "Programa do Jô", pedimos uma retratação deste veículo de comunicação pela violência simbólica perpetrada nas afirmações do programa e requeremos do Estado brasileiro a apuração da responsabilidade pelas ofensas reproduzidas.

Nesse dia, no programa desse conhecido artista brasileiro foi entrevistado o senhor Ruy Morais e Castro. A entrevista realizada com humor expressou frases racistas metamorforseadas em piadas inocentes que eram abonadas pelos sorrisos e aplausos da platéia, como pode ser conferido no endereço eletrônico: http://www.youtube.com/watch?v=ySWZXekdBkw

Durante a reprodução do referido programa, o entrevistado, incitado pelo apresentador, deteve-se em apresentar detalhes do que denominaram "vida sexual angolana". No relato que faz, vê-se a consagração da idéia de que África e os africanos representam uma civilização homogênea caracterizada pela inferioridade cultural e biológica, legitimando a mentalidade racista sustentada no argumento de que o continente africano, os países africanos, os povos africanos, em particular, a mulher africana são inferiores e que esta inferioridade pode ser comprovada por sua sexualidade animalesca.

O constrangimento latente em cada uma das declarações exige uma ação estatal imediata. Não se pode esquecer que o Estado brasileiro assume publicamente o compromisso de promover e defender os direitos humanos do que é prova todas as convenções internacionais de que faz parte. Desde 1994, o Estado brasileiro como signatário da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como "Convenção de Belém do Pará" sabe que é função do Estado "incentivar os meios de comunicação a que formulem diretrizes adequadas de divulgação, que contribuam para a erradicação da violência contra a mulher em todas as suas formas e enalteçam o respeito pela dignidade da mulher". Sabe também, enquanto signatário da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1968) , que "a doutrina da superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, e que não existe justificação para a discriminação racial, em teoria ou na prática, em lugar algum". E ratifica, de acordo com o caput da Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher , que é considerada violência psicológica e moral toda forma de constrangimento e ridicularização dirigido a alguém devido ao seu credo religioso, raça, gênero ou origem nacional.

A entrevista exibida caminha na direção contrária da luta que, em diversos contextos e em distintas partes do mundo, povos de diferentes nacionalidades empreendem contra todos os tipos de opressão. Umas das questões a ser refletida na nossa sociedade global seria a seguinte: como os estereótipos racistas são reinventados em pleno século XXI? (Memmi, 1989/[1957]: 21, Babha, 2005: 105 - 128, Pinto, 1998: 168 - 210)

O senhor Jô Soares e o Senhor Ruy Morais e Castro nos fornecem uma resposta como hipótese: os estereótipos racistas seriam reinventados pela mídia ao veicular atrações racistas como esta, do Programa do Jô. É óbvio que existem outras maneiras de se reinventar o racismo e/ou construir o racismo na sociedade contemporânea, contudo, o desserviço que o poder da mídia pode prestar é um fator considerável dado o seu papel de formadora de opinião. No caso em questão, o fato de a entrevista ter sido televisionada e o seu meio de difusão ter sido a Rede Globo, que detém há anos a maior audiência televisiva do Brasil e ampla exibição internacional, aumenta drasticamente as consequências lesivas das afirmações feitas e a necessidade de ação contra elas.

O programa acima mencionado viola os direitos fundamentais expressos na Constituição Federal de 1988, as Convenções Internacionais de que o país é atualmente signatário e constrange toda a sociedade, como se não bastasse legitimar o ideário racista também acaba por propalar uma potente forma de apologia ao sexismo, à xenofobia e à pedofilia.

Ridicularizando a diversidade cultural, uma das formas mais vis de que a cultura ocidental pode lançar mão para demonstrar sua suposta superioridade, as declarações feitas na entrevista erigem o androcentrismo como único ponto de vista, apresentando a raça negra como expressão do primitivo, do irracional e as mulheres negras como objetos meramente sexuais, onde o único comportamento "esperado", independentemente de sua idade, é a promiscuidade e a subordinação de sua sexualidade ao desejo do homem.

Assim, e por considerarmos temerária esta forma ideológica de propagação do racismo, do sexismo, da xenofobia e da pedofilia é que propomos esse abaixo-assinado, exigindo a apuração de responsabilidades e a pronta retratação da Rede Globo de Televisão em um pedido de desculpas público, com ampla divulgação, pelos constrangimentos a que submeteu às comunidades africanas e angolanas, às mulheres de forma geral, às mulheres negras de forma específica e à sociedade brasileira.


sexta-feira, 23 de novembro de 2007

POR QUE HUGO CHÁVEZ INCOMODA TANTO AS ELITES?

Frei Gilvander Moreira (1)
Profa. Delze dos Santos Laureano(2) e
Prof. Dr. José Luiz Quadros(3)

As transformações sociais em curso na América Latina, especialmente na Venezuela, estão incomodando os diversos grupos que sempre tiveram privilégios insustentáveis. São os mesmos que se apropriam das riquezas naturais e impõem à população um modelo de “desenvolvimento” que degrada de forma irreversível o meio ambiente e provoca o esgarçamento do tecido social, fazendo da sociedade palco de violência sem precedentes.
O medo destes grupos se agrava com a possibilidade concreta de a Venezuela passar a integrar o Mercosul. Por isso, fomenta-se no Brasil um processo de satanização de Hugo Chávez e da Revolução bolivariana. A mídia, o quarto poder, através da Revista Veja, da TV Globo e Cia, procura, de forma orquestrada, macular o processo de libertação ora em curso na Venezuela e na Bolívia. Tenta impedir a construção de uma outra forma de organização política fora da “democracia” liberal hegemônica, esta que pretende ser a vitória do capitalismo sobre o socialismo real, pós-esfacelamento do leste europeu e que teve a pretensão de determinar o “fim da história”.
Estivemos em Caracas, na Venezuela, durante dez dias, no 6o Fórum Social Mundial. Mantemos comunicação com várias pessoas amigas de lá. Diante da enxurrada de calúnia que a mídia propala impiedosamente contra Hugo Chávez, cabe recordar várias coisas que estão acontecendo na Venezuela.
Um grande mutirão pela educação acabou com o analfabetismo naquele país. O povo controla e comercializa o petróleo, grande riqueza natural que agora serve para melhorar a vida das pessoas e não mais aumentar o lucro das multinacionais. O povo venezuelano está cheio de esperança. Uma juventude, em sua maioria esclarecida, está comprometida com a organização popular, com a construção de uma democracia verdadeiramente participativa.
As críticas internas a Hugo Chávez vêm dos canais de TV que estão nas mãos das elites e da minoria privilegiada. A população pobre é beneficiada com preços de 30 a 50% mais baixos do que nos mercados privados nos milhares de Mercados Populares - MERCAL - que alimentam a maioria da população.
Os estudantes que lideram os movimentos por “liberdade” são os de classe média alta, defensores dos ideais de liberdade como privilégio para poucos, mesmo quando o sistema que mantém essa chamada “liberdade” condena à miséria e à exclusão a maioria da população.
Na Venezuela bolivariana, todos os estudantes que cursam universidades públicas, ou que ganham bolsas de estudos, diferentemente do que acontece no Brasil, prestam serviço social à comunidade. Dão uma contrapartida para a sociedade em vista dos recursos públicos que recebem para estudar. Só na Universidade Bolivariana mais de 500 mil jovens pobres estão estudando.
O governo de Hugo Chávez apóia a instalação, regulamentação e funcionamento de rádios comunitárias. Não há burocracia para conseguir a documentação e o governo ajuda financeiramente na compra dos equipamentos para se fortalecer a comunicação alternativa e mais interativa. Assim, não procedem as alegações de que não há liberdade de imprensa na Venezuela. O governo venezuelano não tem o monopólio da informação. Contrariamente investe contra o monopólio dos meios de comunicação, como o que ocorre hoje no Brasil, onde poucas famílias controlam o sistema de informação de massa.
Na Venezuela, atualmente, existem mais de 20 mil médicos cubanos, que, com apenas uma ajuda de custo cerca um salário-mínimo, estão alavancando uma revolução no sistema público de saúde. São responsáveis pelo atendimento primário da população, algo parecido com o médico de família. Estão nas favelas e bairros pobres; lá vivem e atendem, com competência e dedicação, os pobres. "Por mais de 50 anos os médicos venezuelanos recém formados se recusaram a ir para o interior, para os bairros, para a periferia. Só queriam ficar na capital, ganhar dinheiro às custas da dor. Agora, com Chávez, eles tiveram sua chance de ajudar o povo. Não quiseram. Então foi preciso apelar para a solidariedade. Vieram os médicos de Cuba e estamos tendo acesso à saúde nos lugares mais distantes e pobres”, informa um jovem da periferia de Caracas.
Yojin Ramones, um venezuelano que vive no Brasil, referenda nossa percepção, revelando que na Venezuela há uma recuperação acelerada da atividade econômica, melhorando o poder aquisitivo de todos. Isso mesmo, de todos – os venezuelanos, ricos e pobres (antes eram apenas os ricos). O país tem anualmente o crescimento do PIB (Produto Interno bruto) mais elevado da América Latina, cerca de 10% nos últimos anos. Lá são convocados referendos sobre os temas mais importantes do país, de modo que o povo opine e escolha o que quiser. Os abusos dos bancos foram freados pelo governo. Por exemplo, a taxa de juro anual de um cartão de crédito é de 28% a.a. Aqui no Brasil é acima de 120% a.a.
Não há país da América latina que tenha feito tantas obras - como metrôs, pontes, teleférico, aeroportos - em apenas oito anos. Os serviços de saúde devolveram a vista a milhares de pessoas carentes de recursos, não só venezuelanos, mas latino-americanos. Pela primeira vez, muitos bairros pobres têm um médico para dar atenção às pessoas. A integração da América do Sul é prioridade para o fortalecimento de nossas raízes e forças latino-americanas.
Quanto à democracia é importante lembrar que o Hugo Chávez, assim como os partidos políticos que o apóiam, venceu todas as eleições que foram supervisionadas por organismos internacionais e políticos de todo o mundo, inclusive um ex-presidente norte-americano (JIMMY CARTER). Todos atestaram a lisura dos pleitos.
Importante acrescentar que as eleições ocorreram com a grande maioria dos meios de comunicação (jornais, rádios e TV) em franca campanha de difamação contra o governo de Hugo Chávez. Em qualquer parte do mundo, os responsáveis pelas emissoras de rádio e TV, teriam sua concessão cassada, e em alguns países seriam processados por calúnia e difamação, como, por exemplo, nos EUA e na França.
A reforma da Constituição, ora em curso, faz parte de um processo de mudança estrutural radical, que pode transformar a Venezuela em uma sociedade sem miséria, sem exploração e sem exploração, fundada na solidariedade e não na competição, no egoísmo e na ganância.
Para além dos mecanismos de democracia representativa, o povo da Venezuela tem mostrado uma grande capacidade de mobilização e participação, construindo uma democracia participativa que legitima as transformações em curso.
Nós devemos ficar sempre atentos para que o caminho democrático participativo construído na América latina hoje não seja desviado por projetos pessoais. Toda mudança só é legitima se construída democraticamente pelo povo.
Nesta esteira é que temos de defender aguerridamente os povos e os projetos transformadores de Cuba, Venezuela, Bolívia e Equador. Primeiro, porque sãos povos que estão em processo de libertação, lutam com destemor contra o imperialismo e a opressão capitalista neoliberal. Segundo, porque se estes países forem sufocados, teremos que viver mais tempo com os valores da indiferença pelo ser humano que hoje domina as sociedades e ameaça o planeta.


(1)Frei Gilvander Luís Moreira, mestre em Exegese Bíblica e assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina,
e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br

(2)Delze dos Santos Laureano, professora de Direito Constitucional e Direito Agrário, membro da RENAP – Rede Nacional de Advogados Populares
e-mail: delzesantos@hotmail.com

(3)Dr. José Luiz Quadros de Magalhães, professor de Direito Constitucional da UFMG,
e-mail: ceede@uol.com.br


Belo Horizonte, 14/11/2007.

Conheça o sítio do Frei Gilvander: http://www.gilvander.org